Passear pelo Raia Portuguesa | Uma sugestão para conhecerem Marialva, Mêda e Longroiva

A raia portuguesa continua a ser um dos meus destinos de eleição. Pegar no carro e dirigir-me à fronteira e deixar-me embalar pelas planícies onduladas que se escondem por entre montanhas imponentes, que vão rompendo no horizonte. Adoro a bipolaridade da mãe natureza por estas paragens. Tanto me sinto a relaxar na brisa calma que esvoaça na forragem das pastagens, como de repente me sinto a fluir abruptamente no frio rugoso e altivo dos afloramentos graníticos. Pegar no carro e trespassar as curvas de estradas perdidas entre pequenas aldeias e micro aldeias carregadinhas de história e de gentes maravilhosas, sempre prontas, entre um olhar de desconfio e uma sede de caras novas, a dar dois dedos de conversa.




Talvez esta minha paixão pela raia portuguesa seja culpa dos meus pais, que sempre insistiram a embalar-me os sonhos com quilómetros de estradas pouco monótonas. Foram tantos os piqueniques entre fronteiras, entre um Portugal que pisca o olho a Espanha e uma Espanha que tem sempre um pezinho em terras nacionais. Quando era pequena nunca chegámos a cruzar a fronteiras, mas ficávamos no limbo. Sair de Viseu em direcção a Vilar Formoso pelas estradas nacionais era sem dúvida uma aventura. Antes de conhecer Lisboa ou Porto, conheci Marialva e o seu castelo. Subi à janela da igreja junto a este monumento, num momento de atrevimento, interrompido por um grande arrependimento e um salvamento à altura. Antes do Algarve, conheci Longroiva e o seu cemitério dentro do castelo. E, claro, conheci um sentido de estranheza diferente, ou na minha cabeça não fizesse sentido juntar presenças fúnebres com uma casa de princesas. São tantas as histórias que recordo desta raia portuguesa.





No início de Abril, para celebrarmos cá em casa uma data bonita, decidi partilhar com quem me acompanha nesta aventura de vida, as minhas memórias de infância. Saímos de Viseu em direcção à fronteira. No rádio, a banda sonora era esta, e caramba como combinava com a paisagem. A primeira paragem foi junto à aldeia de Devesa, na encosta que sobe até Marialva. Deitámos pés ao caminho e agradecemos as abertas meteorológicas, que afastavam as nuvens cinzentas para diante. Percorremos parte do PR2, sempre a subir. E nem imaginam como foi bom ir parando para descobrir o que a altitude nos permitia alcançar com a vista. Se algum dia fizerem este percurso, não olhem só em frente, para o destino de chegada, permitam-se a aproveitar todo o passeio.

Marialva transporta-me sempre à ideia de aldeia parada no tempo, onde a ruralidade é rainha e senhora e onde o ritmo diário parece adequar-se à pacatez das paisagens. Nos últimos anos, Marialva tem ganho bastante destaque turístico por causa do projecto de alojamento e de turismo Casas do Coro. Um projecto que deu vida novamente a esta pequena aldeia e recuperou algumas das casas que se encontravam devolutas.

Situada a poucos minutos da cidade de Mêda, esta é uma aldeia histórica cuja origem remonta à antiga Cidade de Aravor, fundada pelos Túrdulos no séc VI a.C. Claro que fui buscar esta informação ao site das Aldeias Históricas de Portugal. Uma ferramenta que aconselho a visitarem, antes de se fazerem à estrada. Mas história à parte, Marialva consegue conquistar com a sua construção granítica e imponente, com as ruas labirínticas e estreitas. 

Não se espantem se a dada altura encontrarem cabras a comer a erva que cresce junto às muralhas, ou cães que servem de guias turísticos. Regressados ao carro, rumámos em direcção a Mêda, cidade pequena, que desconhecíamos os dois e que nos surpreendeu pelo centro histórico, pequeno é certo, mas bonito, com casas brasonadas e uma torre do relógio que se eleva acima da urbe e permite uma visão a 360º graus simplesmente maravilhosa.




O nosso destino final era Longroiva, outra das aldeias com história do concelho de Mêda e que estará sempre associada aos piqueniques familiares. A estrada curvilínea que se percorre até Longroiva, dá-nos logo a perceber que para além da fronteira entre Portugal e Espanha, estamos na fronteira entre o Planalto Beirão e o Alto Douro Vinhateiro. Começam a aparecer grandes quintas cujo vinho e azeite são os seus grandes tesouros.

Longroiva é uma pequena povoação, na qual o Castelo é o grande protagonista. Dizem (os sites mais bem informados do que eu) que este é um importante testemunho da arquitectura templária na região. É pena que depois do século XIX o interior do Castelo tenha sido transformado em cemitério. Porém, fico contente por perceber que cada vez mais se faz um trabalho de preservação deste género de monumentos. Atualmente, o Castelo de Longroiva é considerado Monumento Nacional e está protegido. Mas para além de templários, dizem também, que por estas paragens andaram romanos, visigodos e árabes. Eu percebo-os. O ar é puro e limpo, o tempo desenrola-se a um ritmo lento e as termas são perfeitas para quem quer relaxar corpo e mente. O céu nocturno ganha um estrelado difícil de descrever e sentir o silêncio a partir das 21h00, é um verdadeiro luxo. Recuperar as forças em Longroiva é fácil, deixar para traz esta tranquilidade é que pode ser mais difícil.

Se ainda não tiverem planos para o próximo fim-de-semana, atrevam-se a conhecer esta zona entre Portugal e Espanha, entre Planalto Beirão e Alto Douro, entre as planícies e as montanhas, entre a terra trabalhada e o granito mais estéril. Tenham um Bom fim-de-semana.



1 comentário

A.João disse...

É raro alguém escrever sobre a Raia, gostei. Também conheço, principalmente a zona do Douro internacional e mais abaixo a Serra da Malcata e Monsanto. Lugares de muitas histórias, monumentos raramente visitados e paisagens deslumbrantes. Vale a pena visitar estes lugares quase esquecidos e longe do turismo de massas.