(Sem Título)

A meia-noite há muito que me abandonou por estas bandas. Fugiu com certeza do frio que se apodera com uma maléfica lentidão, à medida que o fogo se extingue na lareira. A escuridão envolve os meus pensamentos e esconde, com bondade e compaixão, o fio húmido salgado, que me escorre pelo rosto. Perante, os meus olhos personagens contraditórias movem-se ao som de uma melodia demasiadamente melancólica, num compasso extremamente mecânico. O rancor desponta no seio da minha inquietação, enquanto a alma procura, numa busca inútil, o apaziguamento necessário. É noite. Alguém deixou cair o negro pano sobre a terra, alguém apagou a fogueira, alguém continua a tocar o majestoso piano...A voz desapareceu na fuga imaginária à realidade. Torno-me, assim, cobarde para ordenar a retirada de um cortejo fúnebre que continua o percurso sem obstáculos ou entraves. Um homem agarra-me os cabelos, arrastando a minha dignidade para um turbilhão de passos desajeitados. Procuro o ritmo certo, não destoar de um contexto social com o qual não concordo. Os pés não tocam no chão, erguem-se no pretensioso bulício do tic tic das roldanas a riscarem as pedras dos isqueiros. As faces sem rosto abeiram se de mim com fôlegos alcoolicos....

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